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Relato da artista visual

Um instante suspenso no ar frio e úmido de Paris. Tingido de amarelo pelo sol, pelas árvores e pelos edifícios da cidade, ele colore as fotos e a imaginação dos corpos que aceitaram o desafio: lançar-se ao oceano urbano em estado de devaneio, indo ao encontro da matéria poética. Não é tarefa simples, buscar alegorias no banal, no inútil, no ignorado, no transitório. Caminhamos em um movimento errático, sem certeza de onde o próximo passo nos levará. Mas ele nos guia à contemplação de um universo paralelo ao cotidiano, onde as superfícies ganham profundidade e as imagens revelam camadas e camadas simbólicas. Contemplamos elementos que antes permaneciam turvos nos trajetos diários e eles desvelam histórias, emoções e sensações, antes entorpecidas pela pressa. Rompemos a barreira do útil, procuramos agora o desútil. Um edifício com a fachada colorida de azul hortência, sobre a qual peixes e folhas douradas estão pintados, nos faz mergulhar em reflexões aquáticas e tonais, nele regozijamos com a apreciação estética daquela composição. O monumento de uma coluna da paz armada, contraditória pelo seu nome, nos recebe com alegria no vasto campo verde do parque, em contraste com as copas ainda sem folhas das árvores. Ela lança no céu um pequeno risco branco, celebrando nossa chegada, que não passa despercebido por nós. Prosseguimos nossa jornada e nos deparamos com uma cena dramática. Examinando a escultura, nos comovemos com tal representação: uma leoa, com olhar ao simultaneamente feroz, angustiado e melancólico, encara uma serpente em posição de ataque, observando ao fundo seus filhotes mortos pelo animal peçonhento. A cena trágica reverbera com profundidade em nosso interior e nos penaliza. Nada restou ao animal, que regressa ao lar apenas para descobrir o vazio deixado pela morte de sua ninhada. Essa escultura, tantas vezes vista por nós em nossas caminhadas pelo parque — em todas parcialmente ignorada — a partir daquele momento, ficará marcada em nossa memória. Mas já é tempo de regressar. Assim, retornando simultaneamente ao local de origem e à realidade objetiva, nos despedimos daquela fenda temporal e mental, sem conseguir precisar exatamente o momento em que o espírito, diluído em devaneios, volta-se uma vez mais para o mundo concreto.

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Paris, France, Fevereiro de 2025.

+ (55) (31) 9.8338-7591

Ateliê: Rua Inhaúma, 126, Belo Horizonte, MG

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